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Categoria: Filmes Brasileiros
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dossie-jango p1Dossiê Jango 

O presidente João Goulart morreu no dia 6 de dezembro de 1976. Dez anos depois ainda era uma “dor de cabeça” para os militares. Tanto assim, que a notícia de sua morte, na Argentina, saiu truncada na imprensa. Até hoje, as circunstâncias dessa morte ainda não estão esclarecidas. Cardíaco, o ex-presidente teria sido vítima de um ataque fulminante. Mas há quem sustente que o envenenamento seria a verdadeira causa de sua morte. É em torno dessa dúvida que se constrói o documentário Dossiê Jango, do cineasta Paulo Henrique Fontenelle, lançado em 5 de julho de 2013.

Trilhando caminho original, o filme enriquece a reconstrução trabalhosa dos anos da ditadura (1964-1985). Procura, em sua parte inicial, contextualizar a época e dispor em seus lugares os atores do jogo. Avança, no entanto, ao centrar foco, em sua segunda parte, apenas em João Goulart e em seu controverso desaparecimento. A primeira parte, ao estabelecer a aliança entre civis e militares para a produção do golpe, e a presença dos Estados Unidos na desestabilização do governo, é precisa e didática. Por ocasião da morte de Jango, vivia-se, ainda, a Guerra Fria. Atentados a inimigos políticos não eram incomuns.

As suspeitas de assassinato de João Goulart começaram a surgir logo após a sua morte. A tese era de envenenamento, pois o presidente deposto tomava três medicamentos para controlar o coração. Os remédios, que vinham da França, teriam sido adulterados numa operação conjunta da agência secreta norte-americana (CIA) com os governos do Brasil e da Argentina. O ex-presidente era presença incômoda entre os argentinos, que estavam também sob regime militar. Tudo faz sentido, mas não existem provas. O fato, relembrado no filme através de documentos e depoimentos, é que as dúvidas sempre existiram. Um empresário amigo de Jango (Enrique Foch Díaz) escreveu o livro João Goulart: O Crime Perfeito.

paulo-h-fontenelle in1Em 2006, o caso voltou à tona com o depoimento do uruguaio Mário Barreiro Neira, que afirmou ter participado de uma certa Operação Escorpião, com o objetivo de matar João Goulart. Ao que parece, a testemunha não é lá muito fidedigna. Era um criminoso comum, recrutado pela ditadura daquele país na época da repressão política. Sua versão apresentava muitas contradições, além de não se sustentar desinteressadamente. Ele teria cumprido pena no Brasil e havia contra ele um pedido de extradição do Uruguai, para responder por crimes comuns. Era, portanto, de seu interesse permanecer em solo brasileiro, alegando perseguição política do governo uruguaio.

Em 2008, o Ministério Público aceitou o pedido da família de João Goulart para investigar a morte do ex-presidente, tendo por base aquele depoimento. O órgão concluiu pela falta de provas, tachando o depoimento do uruguaio de “confuso e contraditório”. Isso, porém, não encerrou o caso, como indica, agora, o documentário. Se nada prova que houve assassinato, também não se pode provar que a morte foi natural. O estudo dos costumes políticos das ditaduras latino-americanas não exclui o uso da violência da eliminação de inimigos. A dúvida razoável se adensa pela ausência de autópsia e das mortes quase simultâneas de Juscelino Kubtscheck e de Carlos Lacerda.