Segundo o poeta Hesíodo, Eros nasceu de Geia (Terra para os romanos) e saiu do Caos primitivo (tal como era adorado em Téspias sob a forma de uma pedra bruta). Para os órficos (religiosos tementes a Dioniso), nasceu do Ovo Primordial, engendrado pela Noite, e cujas metades, ao se separarem, formaram a Terra e o Céu. É a virtude atrativa que leva as coisas a se juntarem, criando a vida. É uma força fundamental do mundo. Assegura não somente a continuidade das espécies, como a coesão interna do Cosmos. Em torno desse tema, autores de cosmogonias, poetas e filósofos têm feito numerosas especulações.
Opondo-se à tendência de Eros um dos grandes deuses, surgiu a doutrina apresentada sob a forma de mito no Banquete, de Platão. Nessa obra, ele aparece como um Demônio (força espiritual misteriosa), intermediário entre os deuses e os homens. Segundo Platão, teria nascido da união de Poros (Recurso) e Pênia (Pobreza) no jardim dos deuses, após um festim para o qual foram convidadas todas as divindades. A esta origem deve caracteres bem significativos: sempre em busca do seu objetivo, como Pobreza, ele sabe um meio de chegar a seu alvo, como Recurso.
Longe de ser um deus poderoso, é uma força sempre insatisfeita e inquieta. Seu poder vai além da natureza viva e animada. Ele aproxima, une, mistura, multiplica várias espécies de animais, de vegetais, de minerais, de líquidos, de fluídos — em uma palavra, toda a criação. É, pois, o deus da união, da afinidade universal. Nenhum outro ser pode se furtar à sua influência ou à sua força.
Com o tempo, surgiram várias outras genealogias para o deus. Umas afirmam ser ele o deus do Amor, filho de Hermes (Mercúrio para os romanos) e Artémis (Diana para os romanos). Outras lhe dão como pais Ares (Marte para os romanos) e Afrodite (Vênus para os romanos), enquanto filha de Zeus e Dione. Nesse caso, chamar-se-ia Anteros. Quer dizer, Amor Contrário ou Recíproco.
Todavia, aos poucos, sob a influência de poetas, ele se fixou e tomou sua fisionomia tradicional. Passou a ser apresentado como um garotinho louro, normalmente com asas. Sob a máscara de um menino inocente e travesso, esconde-se um deus perigoso, sempre pronto a traspassar com suas flechas certeiras, envenenadas de amor e paixão, o fígado e o coração de suas vítimas. Veja, abaixo, uma ode do poeta lírico grego Anacreonte (século VI a.C.):
Um dia, lá pela meia-noite,
Quando a Ursa se deita nos braços do Boieiro,
E a raça dos mortais, toda ela, jaz, domada pelo sono,
Foi que Eros apareceu e bateu à minha porta.
“Quem bate à minha porta e rasga meus sonhos?”
Respondeu Eros: “Abre”, ordenou ele;}
“Eu sou uma criancinha, não tenhas medo.”
“Estou encharcado, errante, numa noite sem lua”.
Ouvindo-o, tive pena;
De imediato, acendendo o candeeiro,
Abri a porta e vi um garotinho:
Tinha um arco, asas e uma aljava.
Coloquei-o junto ao fogo
E suas mãos nas minhas aqueci-o,
Espremendo a água úmida
Que lhe escorria dos cabelos.
Eros, depois que se libertou do frio:
“Vamos” — disse ele — “experimentemos este arco”.
“Vejamos se a corda molhada não sofreu prejuízo”.
Retesa o arco e fere-me no fígado,
Bem no meio, como se fora um aguilhão.
Depois, começa a saltar, às gargalhadas:
“Hospedeiro” — acrescentou — “alegra-te”.
“Meu arco está inteiro”.
“Teu coração, porém, ficará partido”.