planodefuga p118 de maio de 2012
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Dirigido pelo estreante Adrian Grunberg, Plano de Fuga traz Mel Gibson no papel de um criminoso americano que ultrapassa a fronteira entre Estados Unidos e o México durante a fuga de um roubo a banco. Ele acaba preso pelas autoridades mexicanas e enviado para um presídio lotado de bandidos de alta periculosidade. Não bastasse essa experiência bizarra, ele acaba se envolvendo com uma família local e se metendo numa grande enrascada em terras estrangeiras porque a bandidagem agora quer a pele dele. Para sobreviver na prisão, ele terá que aceitar a ajuda de um garoto de apenas nove anos, com quem irá planejar sua fuga. Veja trailler abaixo.

Crítica
Ana Maria Bahiana

Em sua longa carreira como ator e diretor, antes, durante e depois de se tornar um super-astro, Mel Gibson fez, basicamente, um mesmo personagem: o homem que, sozinho, contra tudo e contra todos, arrisca a própria vida em troca de seus ideais e metas.  Do icônico Mad Max ao exausto detetive de O Fim da Escuridão, do jovem soldado de Gallipoli, de Peter Weir (um filmaço, aliás) ao rebelde William Wallace de Coração Valente, do alucinado Martin Riggs da franquia Máquina Mortífera ao “patriota”  Benjamin Martin, todos os homens da vida fictícia de Mel Gibson são mal contidas metralhadoras giratórias de paixão, balas presas num gatilho humano.

Mesmo em filmes que dirigiu, mas nos quais não atuou, o herói é assim, não importa se na pele de Jesus de Nazaré ou do jovem guerreiro maia de Apokalypto. Só Gibson sabe que dobras da sua alma e episódios de sua vida dão contornos tão bem definidos aos seus “eus” fictícios. Depois da via crucis em que se meteu nos últimos anos, podemos imaginar de onde vem os demônios que alimentam esses homens velozes e furiosos. Pessoalmente, acho que nem todas as iterações desse personagem são bem sucedidas (pessoalmente também, gosto especialmente de Gallipoli, O Ano Em Que Vivemos em Perigo e O Fim da Escuridão. Além de Mad Max, que, pensando bem, não é um personagem, é um alter ego).

Também acho que Gibson já pagou mais do que acham que ele devia, e que Plano de Fuga (Get the Gingo), o novo filme que ele escreveu, produziu e estrela, merecia um lançamento em cinemas nos EstadosUnidos. Até porque seria um bom negócio. Uma das maiores idiotices desta indústria é fazer essa mixórdia de impulsos pessoais e decisões de negócios. Quem não comprou Plano de Fuga para cinemas deve ter pensado que Mel, o maldito, não tinha mais cacife para atrair público; ou isso ou deveria ser punido um pouco mais (os paralelos com o personagem-mito de Mel estão aumentando…). Dois péssimos motivos para uma decisão como, espero, vão comprovar as bilheterias internacionais. 

Porque Plano de Fuga  é um filme muito bom. Não vai mudar o mundo ou o cinema, mas é um sólido e bem executado híbrido de ação tarantinesca, western peckinpesco e drama favelado latino-americano. Quem pagar ingresso para assistir os primeiros e sensacionais 15 minutos, com dois palhaços — um deles cuspindo sangue aos borbotões — em disparada pelo deserto do Texas num carro caindo aos pedaços, ao som de “50,000 Miles Beneath My Brain”, do ten Years After já vai se sentir recompensado. Mas aconselho que fique para o resto da breve, compacta, incessante hora e meia.

Trancafiado em El Pueblito, uma bizaríssima prisão mexicana, o anônimo motorista do carro da sequência de abertura (Mel Gibson) descobre todo um novo mundo de terrores e possibilidades. E, inspirado pela amizade com um menino igualmente sem nome (o excelente Kevin Hernandez, que merece um filme só dele), planeja e executa um golpe tipicamente gibsonesco. O universo que Adrian Grunberg (também diretor) e Gibson constróem no bem estruturado roteiro é, de muitos modos, o pano de fundo ideal para nosso velho conhecido, o herói hiper-individualista e suicida da carreira de Mel. Não há princípios, lei, ética, moral, certo e errado. No perversamente absurdo mundo de El Pueblito reina apenas a sobrevivência e o domínio do mais forte (ou mais esperto). É Alice do outro lado da toca do coelho, com muitas armas, lucha libre e narcocorrido — um mundo em queda livre onde um homem só, antissocial e possivelmente psicopata, pode, por um breve momento, ser herói por default.

Admiro muitíssimo, em Plano de Fuga, o notável trabalho da direção de arte de Bernardo Trujillo, que criou toda a prisão em Veracruz, no México (próximo das locações de Apocalypto),  o excelente conjunto de atores latinos e a maravilhosa trilha incidental do brasileiro Antônio Pinto. Mas admiro especialmente a segurança do diretor estreante Adrian Grunberg,  que foi assistente de direção em, entre outros, Apocalypto, Traffic e Amores Perros (cuja estética informa bastante suas escolhas).  É um projeto complexo em todos os aspectos, da logística à temática, e Grunberg se sai muito bem, mostrando que tem um estilo próprio, além das suas influências.

Americanos na tela grande

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